Idolatria não é amor
Por Coltri Junior
Certa vez, no programa Altas Horas, apresentado pelo Serginho Groisman, estava presente o filósofo e Professor Mário Sérgio Cortella.
Uma pessoa da plateia, então, se dirigiu a ele e disse que deveria ser incrível ser da família dele, ser seu filho ou sua filha. Como deveria ser conviver com uma pessoa tão sábia?
Cortella, então, dentro de sua verdadeira sapiência, respondeu: “a melhor maneira de acabar com um ídolo é conviver com ele”.
O nosso outro lado
De fato, quando o ouvimos na Televisão ou no rádio, quando assistimos a um vídeo dele no Youtube ou Instagram, ou mesmo quando estamos presentes em uma de suas palestras, tudo é maravilhoso.
Ele está dedicado àquilo e assumi aquela “personagem”.
E isso é muito bom, diga-se de passagem, porque há aqueles famosos que são intragáveis. Cortella é o contrário disso.
Mas, não é possível que tenhamos o mesmo comportamento todos os dias, todas as horas. Ficamos irritados, de mau humor, sem vontade de cantar uma linda canção, em alguns momentos. E é aí que o outro lado da pessoa aparece.
Dessa forma, quanto menos convivemos com as pessoas, mais fácil é manter essa personagem. Quanto mais a gente convive, há muito mais oportunidades desse outro lado se apresentar a nós.
Idolatria e amor vêm da paixão
Por isso, idolatria não é amor. Mas, talvez estejam no mesmo nível hierárquico. São o resultado do desenvolvimento da paixão. Esta, muitas vezes coloca um véu em nossos olhos. E isso também não é de todo ruim.
Se, de cara, nos depararmos friamente com os lados “ruins” das pessoas, como vamos nos apaixonar? Se não nos apaixonarmos, como vamos amar? Paixão é encantamento. Amor é discernimento.
Por isso, o amor, em todos os sentidos, seja em uma relação amorosa, de pais e filhos, entre irmãos, amigos etc., é a paixão aprimorada, desenvolvida. Ele nos dá, em termos, a medida certa do quanto suportamos desses “outros lados” que a outra pessoa tem (e ela em relação a nós, também).
E só conseguiremos seguir na relação em função dos registros de outrora, daquele encantamento inicial, das experiências juntas que tivemos e, também, em função disso, daquelas que ainda esperamos ter.
Quando tudo isso se esvai, o amor acaba, a relação fica impossibilitada.
A idolatria não se sustenta com o convívio
A idolatria, por sua vez, é, também, o desenvolvimento da paixão, mas, ao invés de “cair o véu” e vermos a pessoa de um modo mais próximo como ela realmente é, o tecido engrossa e nos faz cegar.
Fazemos uma imagem totalmente distorcida daquela pessoa, como se ela fosse perfeita. E ela, assim como todos nós, estamos longe da perfeição.
Por isso, cuidado com a idolatria. Como disso o Cortella, conviver com ele é igual com qualquer outra pessoa.
Há momentos bons e momentos ruins. Será que os filhos dele o veem como as pessoas “de fora”? Creio que não. Eles conhecem as fraquezas, as angústias do pai.
Mas isso não o torna menor, muito pelo contrário, porque o convívio verdadeiro está em ser feliz juntos, apesar de tudo aquilo que, no outro, incomoda.
Pense nisso, se quiser, é claro!