Como nossos pais, mas com IA
Por Coltri Jr.
Nesta semana, a Volkswagen lançou a campanha de comemoração dos seus 70 anos no Brasil, causando um “reboliço” nos meios de comunicação. Muitos se emocionaram. Outros se rebelaram.
A questão envolve alguns aspectos importantes.
O Significado de Como Nossos Pais
O fato é que a canção Como nossos pais, que é de autoria do Belchior, faz uma crítica ao ser adulto que, conforme vai envelhecendo, se esquece dos ideais de mudar o mundo, típico da adolescência e início da juventude, tornando-se igual à geração anterior, passando, então, a contar seus metais.
Vale lembrar que Elis Regina é ainda mais dura em sua interpretação: troca “seus metais” por “vil metal”.
Ainda, os “rebeldes” questionam a criação da imagem da Elis via inteligência artificial, contracenando com sua filha, Maria Rita.
Inteligência Artificial: está tudo liberado?
Claro que essa é uma questão que, levada ao extremo da criação, é preciso cuidado. É importante saber que precisamos, sim, criar uma ética sobre isso.
E ética, sempre, envolve todos os lados de modo que nenhum saiam prejudicados, tampouco um outro que, a princípio, não foi envolvido no debate.
A saber, um dos argumentos é que a criação audiovisual fique dependente da Inteligência Artificial e usando pessoas famosas, já falecidas, como instrumento de sucesso.
Em princípio, temos duas questões aqui: a primeira é que, com o passar do tempo, se novos seres humanos não atingirem um certo grau de sucesso, novas gerações não terão referência.
Dessa forma, vale pensar em qual será a representatividade da Elis Regina daqui a 70 anos, quando quase todos nós que somos adultos já não estivermos mais aqui?
Já que a Elis se foi há mais de 40 anos, grosso modo, é só pensar no que representa os anos de 1910 para nós: quase nada (aí já é outra canção, do Zeca Baleiro).
Elis com sua filha, é só isso
Outro ponto importante é que a imagem da Elis não foi utilizada de um modo qualquer, mas, sim, contracenando com sua filha, portanto, com apoio da família (claro que, dentro dessa nova ética, pode ser pensada em uma autorização, ou não, da nossa imagem via IA após nossa morte).
Um outro ponto importante é que a publicidade é uma criação, portanto, de livre interpretação.
A peça até pode passar uma nova ideia sobre o significado dos versos do Belchior, no sentido de nos conformarmos em sermos como nossos pais, que é assim mesmo. Eu mesmo tive essa impressão em alguns momentos.
Seja como for, o fato é que precisamos aprender a ler as mensagens porque, no fim, não é isso, mas, sim, o reviver as experiências de infância que tínhamos. Nossa memória afetiva fala muito alto.
Por isso, precisamos aprender a mudar o que precisa ser mudado, mas o que foi bom, pode ser relembrado, relido, refeito (e nunca será igual).
Por exemplo, no filme Férias Frustradas de 2015, o personagem principal quer reviver, com sua família, a experiência que teve com seus pais, visitando o parque de diversões Wally World.
Surpreendentemente, eu mesmo passei por isso. Quis levar minha família a um hotel fazenda, em Serra Negra, por ter tido uma experiencia maravilhosa com minha família, quando tinha 16 anos. E foi muito parecido com o filme. A ida mais recente foi turbulenta.
O fato é que tudo foi muito bem pensado (e está difícil ver isso na publicidade, atualmente).
O presente e o passado
A fim de mostrar esse hiato entre o presente e o passado, Elis aparece na Kombi antiga, Maria Rita na nova Kombi (agora elétrica, ou seja, sem combustível fóssil, de modo a não ser tão como nossos pais – traz a memória afetiva, mas, ao mesmo tempo, a adaptação ao nosso mundo atual, às necessidades ambientais, inclusive), ao som de Como nossos pais, em uma sequência de imagens realmente emocionantes.
E mais: Belchior, autor da canção, não foi esquecido. Aparece em uma camiseta.
Dessa maneira, creio que foi um belo trabalho, com todos os direitos pagos, autorizações concedidas (com exceção da própria Elis, mas lembrando que continuamos ouvindo sua voz original e vendo seus vídeos – será que deveríamos, também?), emoções guardadas trazidas à tona e, claro, a mensagem passada e fixada.
Enfim, a publicidade em um real estado de arte: publiciarte.
Pense nisso, se quiser, é claro!
Prof. Ms. Coltri Junior é consultor, palestrante, adm. de empresas, mestre em educação, professor, escritor e CEO do Hardcore Game Channel. www.coltri.com.br; Insta: @coltrijunior